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Sermão das Sete Palavras de Jesus na Cruz


Publicado em 09 Abril de 2023
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Sermão das Sete Palavras de Jesus na Cruz

 

Dirijamos nosso olhar à cruz redentora, que abraça Jesus, que é santificada pelo seu sangue derramado por amor à humanidade. Olhemos essa árvore da vida que alimenta a nossa esperança. No corpo de Jesus Crucificado, contemplemos todos os inocentes crucificados injustamente, sobretudo os que padecem a vergonhosa dor da fome e a morte como consequência. Como afirma o DAp, “No rosto de Jesus Cristo, morto e ressuscitado, maltratado por nossos pecados e glorificado pelo Pai, nesse rosto doente e glorioso, com o olhar da fé podemos ver o rosto humilhado de tantos homens e mulheres de nossos povos e, ao mesmo tempo, sua vocação à liberdade dos filhos de Deus” (DAp n. 32).

Neste encontro de irmãos, movidos por nossa piedade popular carregada pela emoção deste dia, refletimos sobre as últimas frases proferidas por Jesus durante o seu martírio final na cruz, selecionadas dos quatro Evangelhos. Essas palavras são o resumo da sua vida entregue por amor à humanidade. Suas palavras demonstram toda a grandeza do seu coração e o sofrimento da sua alma. Não são delírios de um condenado, nos seus últimos suspiros, arrependido do que fizera, mas o testemunho de alguém que amou até as últimas consequências, que não abriu mão dos seus valores, mesmo tendo de morrer por eles. Cada palavra dita está repleta de amor. Na boca de Jesus os evangelistas colocam alguns Salmos rezados pela comunidade cristã, invocando a Deus a partir do sofrimento que passava.  Essas palavras devem comover e mover o nosso coração a amar como Jesus amou. 

     1. Pai, perdoa-os, eles não sabem o que fazem (Lc 23,34)

A primeira palavra que sai da boca do crucificado e sofrido Jesus Cristo não é de maldição e revolta, como era comum entre os condenados à morte de cruz, mas de perdão. Do coração daquele que passou a vida amando não poderia sair uma palavra diferente: Ele amou até o último suspiro da sua vida. É comum entre alguns moribundos, no final da vida, chamar os desafetos para pedir perdão. Jesus não tinha pecado, nunca fizera o mal, por isso oferece o perdão nos seus últimos instantes de vida. Ele tinha motivos humanos para gritar a sua dor e berrar contra a injustiça que sofria, mas preferiu o caminho da misericórdia. Ele testemunha na cruz o seu pedido para amar os inimigos e rezar pelos perseguidores (Cf Mt 5,44). O gesto de Jesus nos desafia a amar sempre, a nunca destilar ódio contra os que erram. Conforme João, o amor a Deus, a quem não vemos, é incompatível com o ódio ao irmão, a quem vemos (Cf. 1Jo 4,20-21).

Nos últimos tempos constatamos o crescimento da cultura do ódio, da agressão e da violência contra as pessoas prejulgadas inimigas. Algumas agressões partem de quem se diz cristão, defensor da ortodoxia, em nome de Deus, da família e de alguns valores que julgam importantes. Usam os meios digitais para atacar até mesmo pessoas que nunca viram. Quem assim age assemelha-se aos religiosos que  condenaram à morte o justo Jesus Cristo, movidos por inveja odiosa. Leem um evangelho diferente do Evangelho dele. Diferente de Jesus, nós temos muitas razões para pedir perdão, pois somos pecadores. Assim como a vida de Jesus foi marcada pelo perdão, a vida dos seus seguidores também deve levar essa marca. Seguindo o seu ensinamento, devemos, a cada dia, pedir perdão a Deus e também a graça de perdoar a quem nos ofende (Cf. Mt 6,12). Rezar o Pai Nosso.

      2. Hoje estarás comigo no paraíso (Lc 23,43)

Ao longo do seu ministério, Jesus não recusou os pecadores. Em cada encontro com eles, manifestava a sua misericórdia, os tocava com seu amor, que transformava os seus corações. Ele não se colocava como um juiz implacável que veio para condenar, mas para perdoar. Também nos seus instantes finais tem a companhia de dois pecadores condenados, ladeando sua cruz, com um deles reconhecendo seus erros (Cf. Lc 23,40-41). Àquele que se reconhece pecador e necessitado do perdão, oferece o paraíso. No projeto original de Deus, o homem fora colocado no paraíso, mas o perdeu com seu egoísmo. Na cruz, Jesus promete novamente o paraíso, naquele mesmo dia. Ele restitui, com o seu sacrifício redentor, o paraíso que o Pai oferecera, não somente ao ladrão arrependido, mas a todos os pecadores que se abrem ao seu perdão. A misericórdia de Jesus alcança a todos, seu perdão não tem limite. Ele veio para que todos tenham vida já aqui, mas plenificada na eternidade. Viveu para salvar e morre salvando os pecadores. Sua sepultura é num jardim, símbolo da retomada do projeto divino.  

3. Mulher, eis aí o teu filho; filho, eis aí a tua mãe (Jo 19,26)

O evangelista João registra a presença da mãe de Jesus e de algumas mulheres junto à sua cruz. As mulheres sempre foram acolhidas, amadas e perdoadas por Jesus. Provavelmente não foram consultadas sobre sua condenação, pois não tinham direito a opinar. Elas não teriam pedido a condenação de Jesus. Ao amor recebido, correspondem: são solidárias ao longo da vida de Jesus e ficam ao seu lado no momento mais sofrido da sua existência humana. Maria está junto à sua cruz, com suas amigas. Com certeza foi o momento mais sofrido da vida dela, que mãe alguma desejaria passar. Ela o fortalece com sua presença materna. Seu olhar silencioso e sofrido acalenta a alma do Filho amado. “A coisa mais parecida com os olhos de Deus são os olhos de uma mãe. O olhar de uma mãe humaniza o filho” (Tolentino, Elogio da Sede, p. 152). Como necessitamos da presença da nossa mãe nos nossos momentos sofridos! Por quem gritamos, na nossa pequenez, quando passamos apuros? Que bom ter a mãe consolando-nos na nossa dor! Mas Maria também conta com a preocupação do Filho sofrido, que encarrega João de cuidar dela. Na cruz, Jesus confia à sua mãe a missão da maternidade universal. Ela cuidará de todos os seus filhos e filhas marcados pelo sofrimento. Seu olhar misericordioso alcança todas as pessoas aflitas. Na fidelidade à missão recebida de Jesus, ela quer dar à luz um mundo novo, onde todos sejam irmãos, onde haja lugar para cada descartado da nossa sociedade, onde resplandeça a justiça e a paz (Cf. Fratelli Tutti, n. 278).

A vocês mulheres, especialmente, nossa gratidão por tanta generosidade. Obrigado por terem cuidado dos filhos, parentes e amigos ao longo desse tempo sofrido de pandemia e ao longo da vida.

4. Meu Deus, meu Deus, por que me abandonaste? (Mt 27,46b; Mc 15,34b)

Mateus descreve dois gritos de Jesus. No primeiro (Mt 27,46b), coloca nos seus lábios o versículo que inicia o Salmo 22. O segundo grito é um último suspiro de dor entregando o espírito nas mãos do Pai (Mt 27, 50).  No grito de Jesus ressoa a dor de tantos inocentes condenados injustamente, que se sentem fragilizados e abandonados por todos. É muita dor, é muito sofrimento, é muita humilhação. Uma vida doada por amor, que recebe desamor e morte. Uma vida doada pela vida dos outros, que recebe ingratidão.

Como o inocente Jesus, também uma multidão é abandonada no nosso país, e condenada pela ganância humana e pela irresponsabilidade de muitas autoridades públicas, a morrer de fome. No grito sofrido de Jesus ecoa o grito dos famintos, que não têm força para gritar. A fome além de uma tragédia, é também vergonha para a humanidade, conforme o papa Francisco (Texto-base da CF 2023 n.6). O grito de Jesus não fica perdido no vazio, chega aos ouvidos de Deus, que o responde com a sua ressurreição. Deus nunca o abandonou! O grito de Jesus irrompe em vida.

Rezemos uma parte da oração da CF 2023: “Pai de bondade: inspirai-nos o sonho de um mundo novo, de diálogo, justiça, igualdade e paz. Ajudai-nos a promover uma sociedade mais solidária, sem fome, sem pobreza, violência e guerra. Livrai-nos do pecado da indiferença com a vida”.

5. Tenho sede (Jo 19,28)

Jesus não pede um pouco de água, mas diz ter sede. Sua sede não é física. No Evangelho de João a palavra sede é pronunciada por Jesus outras seis vezes (Cf. Jo 4,23-15; 6,37; 7,37-38). A sua sede é o desejo de saciar a insaciável sede da humanidade. Na cruz, do seu lado aberto pela lança brotará essa água (Cf. Jo 19,34). Da sua morte brota a vida em abundância que Ele veio ofertar.    

Jesus tem sede de tocar as nossas sedes, de entrar nos nossos desertos, de tocar as nossas feridas; é a sede de amar e de que nos deixemos amar e nos amemos como ele nos amou. Conforme o Cardeal Tolentino, “a sede de Jesus é uma sede de amor pelas pessoas tal como são, com a sua pobreza e as suas feridas, com as suas máscaras e os seus mecanismos de defesa e com toda a sua beleza. A sua sede é que cada um de nós – grande ou pequeno, pouco importa – possa viver plenamente e experimentar o máximo de alegria. A sua sede é romper as cadeias que nos trancam na culpa e no egoísmo, impedindo-nos de avançar e de crescer na liberdade interior. A sua sede é libertar as energias mais profundas que se escondem em nós para que possamos nos tornar homens e mulheres de compaixão, artesãos da paz como ele, sem fugir dos sofrimentos e dos conflitos do nosso fragmentado mundo, mas tomando o nosso lugar e construindo comunidades e lugares de amor, de maneira a acender uma esperança nesta terra” (Tolentino, Elogio da Sede, p. 78).  Também somos sedentos de Deus, uma sede que poderá ser saciada somente no encontro definitivo com Ele.

6. Tudo está consumado (Jo 19,30)

A vida de Jesus foi intensa. Foi bem vivida. Ele tem a consciência tranquila de que cumpriu em tudo a vontade do Pai e agora se abandona nos braços amorosos dele. Sua morte é o último cumprimento da obra que veio realizar. A obra da criação divina, avaliada por Deus como muito boa (Cf. Gn 1,31), arruinada pela maldade humana, é restaurada na cruz de Cristo, a nova árvore da vida. Da parte de Deus, tudo está concluído no mistério pascal do seu Filho Jesus. No sim dele, até à morte de cruz, fruto do seu amor, a salvação está confirmada. Da nossa parte, ainda está em andamento, o Reino é uma realidade em construção. Cabe-nos abrir o coração ao amor oferecido, e continuar a missão daquele que amou até às últimas consequências, que amou até à morte. Sua vida não foi inútil, seu amor não foi em vão.

7. Pai, em tuas mãos entrego o meu espírito (Lc 23,46)

Estas são as últimas palavras de Jesus na cruz, conforme o evangelista Lucas. Jesus entrega a sua vida nas mãos de Deus rezando um versículo do Salmo 31 (v. 6), mas dizendo Pai, ao invés de Deus. Ele foi obediente até a morte, e morte de cruz (Cf. Fl 2,8). Somente quem tem consciência de ter cumprido bem a sua missão é capaz de acolher a morte com serenidade e paz. Ela não é horripilante como pinta a arte popular. Quem sempre confiou no Pai é capaz de abandonar-se totalmente nos seus braços amorosos.

A exemplo de Jesus, devemos confiar sempre a nossa vida às mãos de Deus, não somente na hora final da nossa existência. Quem vive o absoluto de Deus entende a relatividade do mundo, que tudo passa e só Deus basta. Mas o passageiro deve ser vivido com muito amor, com os olhos voltados para a eternidade. No hoje, construímos o nosso amanhã. O amor deve ser a marca do instante da nossa vida.   

 

Com a oração do abandono, de São Charles de Foucauld, concluo esta reflexão:

“Meu Pai, a vós me abandono. Fazei de mim o que quiserdes.

O que de mim fizerdes eu vos agradeço.

Estou pronto para tudo, aceito tudo,

contanto que a vossa vontade se faça em mim

e em todas as vossas criaturas:

não quero outra coisa, meu  Deus.

Entrego a minha vida em vossas mãos, eu vo-la dou, meu Deus,

com todo amor do meu coração porque eu vos amo e

porque é para mim uma necessidade de amor dar-me,

entregar-me em vossas mãos sem medida,

com infinita confiança, porque sois meu Pai”.

 


Fonte: Diocese de Goiás


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